domingo, 20 de abril de 2008

Sobre Unilateralidade.

.Não esse não vai ser mais um conto, um conto desses meus normais. Não, por favor, não confunda não-normal, com algo especial, eu não teria essa pretensão. O que eu quero dizer com “não-normal” é que ele é, só, diferente, sem ser excepcional... Me compliquei, não foi? Tudo bem. Acontece que ele não vai ser igual ao outros, em que a narradora (ou quem quer que seja) brincando de Deus, em sua clarividência, sabe de tudo que se passa em todos os lugares e pensamentos. Sabe o que “Ela” e “Ele” pensam ao mesmo tempo.
.Dessa vez eu serei, um tanto quanto, mais realista na minha unilateralidade. ! Não é assim que você chama? Unilateral. Eu até que gosto dessa palavra... Talvez gostasse mais se você não tentasse me ofender, dizendo que eu sou unilateral em excesso na tal da “vida real” como você chama. Mas o que você talvez não saiba que SIM realmente “a arte imita a vida” ou vice-versa... Eu só sei que as duas são tão interligadas em mim, que às vezes é difícil saber o que imitou o que, o que veio primeiro, se a idéia, ou a inspiração. Você me entende?
.Talvez toda essa omnipresença ou omnipotência, sei lá, desses narradores ou personagens, sejam só uma maneira de eu tentar entender o porquê de determinadas reações, talvez seja um jeito de eu tentar adquirir um pouco dessa bilateralidade toda. Mas talvez toda essa tentativa só esgote a minha bilateralidade em algo que não seja você, você não, (olha a unilateralidade de novo) nós dois. Você me entende?
.Ta tudo bem, eu também não entendo você às vezes, mas porque tanta necessidade de entender? Não dá pra aceitar-mos sem entender? Como a maioria das pessoas faz com a filosofia? Ou algumas mulheres com o futebol? Será que não podemos pular essa parte do entendimento e irmos direto para a aceitação? Algo como engolir sem mastigar? Aceitar sem reclamar?
.Acho (unilateralmente) que a única coisa que devemos entender é afinal, o que, nesse turbilhão de coisas é que nos faz querer tanto um ao outro. E destrinchar, desmanchar tudo, jogando fora a precisão, o medo, a solidão, até acharmos o que sobra. Sabe, eu queria que sobrasse amor. Eu queria muito que sobrasse amor.
.Mas e o conto? Sim, o meu conto. É sobre uma menina, sim uma menina sim. E o que tem essa menina? Ela está no quarto, trancada, no escuro. No teto algumas figuras estranhas dançam no ar penduradas por um fio bastante fino de linha branca. E eu consigo vê-las, ela consegue, (sim eu, ela) porque a luz do som que está ligado dá um tom de quase escuridão.
.Alguma música que toca, que ela mesma colocou, aquela que ela, eu, acha, que ele, você, gosta, sabe?

“And I'll always be waiting for you...”

.E suspira de olhos fechados… Sentindo devagar algum sentimento que sobe a cintura e sentindo um arrepio que da cintura desce, enquanto alguma coisa quente e salgada sai em fio dos seus olhos, escorrendo até molhar o lençol em que ela se deita.
.Você saber por que ela chora? Eu sei. Ela chora porque ela quer muito alguém. Ela chora porque ela ama alguém mais do que a ela mesma. “Sem personalidade” diriam alguns... “Sem amor próprio” ou até “Coitada, tão tola”. Egoístas. Todos. Não sabem o sacrifício que é abdicar pelo outro, sabe esse negócio de amar exige esforço. Ela é generosa e não egoísta.
.Mas fundamentalmente não era por isso que ela chorava. O relacionamento dela não ia muito bem há algum tempo. Eles se desentendiam tanto, brigavam tanto, mas se amavam tanto. Às vezes nessas noites de sentimentos cintura acima, cintura abaixo, olhos afora, narinas adentro, ela queria tanto que ele dissesse que tudo ia ficar bem, queria que ele dissesse o que ele pensava, sentia, vivia, fazia. Ela queria saber dele, dos tormentos e dos medos dele. Ela estava tão cansada de saber dela, ser dela e ter só a ela. .
.Não, eu não vou me estender! Meu conto é sobre uma menina que chora sozinha, no escuro do seu quarto, por querer saber do namorado, ser do namorado, ter o namorado.
.E sabe, eu não posso mudar o rumo dessa história, não posso fazê-la sofrer menos, porque eu não sei o que Ele pensa, o que Ele quer. E eu não posso sequer prosseguir com essa história, porque nesse conto, eu, ela, a narradora, é, somos, não-omnipotentes, não-omnipresentes.
.Então, ela vai chorar ouvindo

“Oh, did you want me to change? Well, I’ve changed for good”

até conseguir pegar no sono.
.Sentiu a unilateralidade nisso tudo ? Então, é isso, eu estou tentando esgotá-la!

Adrielly
17/04/07

PS: Desilusões amorosas sempre ajudam. Que continue assim.

5 comentários:

Kaká disse...

"Às vezes nessas noites de sentimentos cintura acima, cintura abaixo, olhos afora, narinas adentro, ela queria tanto que ele dissesse que tudo ia ficar bem, queria que ele dissesse o que ele pensava, sentia, vivia, fazia. Ela queria saber dele, dos tormentos e dos medos dele. Ela estava tão cansada de saber dela, ser dela e ter só a ela."

Eh isso! Exatamente isso!
Entendo... compreendo as vezes, mas entendo sempre!

Ebtão eh isso... essa bosta da unilateralidade nos mastigando e nos enfiando coisas desgostosas goela abaixo!
Adoro como vc escreve as coisas!
bjuu moree!

=*
te amo

Ricardo Almeida disse...

No final, sobra o amor. Infelizmente, muitas vezes, unilateral.
bjs
PS Você e a Fernanda são muito generosas. Obrigado pelo carinho com os meus escritos.

Maria Clarinda disse...

Pois...gostei bastante do teu post!!!
Jinhos mil

O Profeta disse...

A tua intelectualidade não pára de me espantar...


Doce beijo

Lu Morena disse...

Unilateralidade... Essa impossibilidade de saber o que se passa dentro do outro, o que ele pensa, como vê as coisas, como sente... isso tudo me impressiona. Especialmente por saber que eu, e só eu, posso apenas pensar meus pensamentos, sentir meus sentimentos, praticar minhas ações, falar minhas palavras, ver o que vejo... e nunca poderei me ver, a mim mesma, assim, pessoalmente. Enquanto eu posso ver o outro, tocar, ouvir e só. Essa unilateralidade é coisa dos limites dos sentidos e do corpo como invólucro da alma. Só os narradores sabem de tudo e podem afirmar com certeza o que se passar em/com todos os personagens. Às vezes eu queria ser narradora e roteirista da minha própria vida... mas aí eu penso bem, o elemento surpresa faria uma falta danada. A vida seria mais vazia e entediante sem as noites chorosas ouvindo música...