Acabaram as histórias. Acabou a imaginação. E o velho contador de histórias já não sabe o que falar. Chapeuzinho Vermelho há muito tempo ficou para trás, depois Pinóquio, e todas as princesas. Feiurinha, gato de botas, esses aí então já não sabia nem mais contar. Depois que as crianças começaram a ir para escola cada vez mais cedo, os avós perderam a utilidade de contar histórias de contos de fadas às crianças. E ele que sempre fora o irmão mais velho, desde pequeno contava histórias aos irmãos menores, foi quando desenvolveu um enorme dom, o de mentir, ops, de sonhar. Contava histórias fascinantes, que nem mesmo haviam existido, a não ser, algumas que saiam quase prontas de seus sonhos. E sonhava toda noite, e ficava o dia todo remoendo, reinventando, recontando aquela história consigo mesmo, para contar aos irmãos mais novos, que aliás adoravam e só dormiam depois da "sessão histórias". Histórias lindas de princesas, donzelas, borralheiras, perseverança, força de vontade, compaixão, paixão e AMOR. Porque toda história bonita é movida pelo AMOR, pela PAIXÃO.
Tinha 4 irmãos mais novos, e todos eles cresceram com as histórias que ele não revelava para ninguém de onde vieram, histórias que sempre começavam com “num reino distante, bem distante”, ou “há muito tempo atrás”, ou “um amigo da prima da tia da vizinha do meu colega de classe, disse”, de tantas histórias bonitas, aprendeu a mentir como ninguém, mas nunca aprendeu a acreditar ele mesmo nas suas mentiras (às vezes isso dá mais credibilidade) e nas mentiras alheias (se acreditasse nas mentiras alheias a vida teria sido melhor).
Seu irmão mais novo, hoje com 44 anos, formado e doutor em educação física, o de 47 anos um dos maiores produtores de comercial para TV, o de 40 anos médico, o de 51; advogado. Pessoas que acreditavam que as histórias eram reais, que acreditavam em sonhos e que correr atrás os faz realizar, pessoas que acreditam em amor em pleno século XXI.
Lançou um livro ainda com 21 anos cheio de histórias, sonhadas e imaginadas por ele mesmo, já havia inventado tantas histórias que começava a sentir que todas eram iguais, foi se entristecendo se fechando mal falava com medo de desperdiçar alguma boa frase para suas histórias. Casou-se, teve 3 filhos, foi quando voltou a sonhar, a se lembrar como se contava uma boa história, lançou o 2º livro, 30 anos. O tempo, a calma, as crianças crescidas, a família, isso lhe rendeu mais histórias, 3º livro, fim, 43 anos, acabou. Foi enlouquecendo, se isolando, não falava, o dia todo rodando a cidade; nenhuma história, o dia todo dormindo e nada de sonhos, enlouqueceu aos 45, sem esperança, sem o “amor” das histórias de reis e fadas, sem medo ou compaixão ou bravura, porque ele sabia, só ele, que essas histórias eram apenas mentiras bem contadas, contadas com carinho, apenas sonhos enfeitados com margaridas bem perfumadas. Só ele sabia que grande fingidor era ele..
E ele hoje com 60 anos, mal se formou em letras, lançou 3 livros quase-sucessos-quase-fracassos, hoje mora aqui nessa clínica ao lado da minha casa (a família internou, não sabia o que fazer), onde em raros momentos de sanidade grita pelo buraco do muro a sua história. Hoje ele é só mais um velho de 60 anos. Sem histórias pra contar e sem imaginação o velho contador de histórias já não sabe o que falar.
Obs: A fase ruim tá que passa. ;)
19 comentários:
um dia as "infinitas" águas da imaginação secam, elas vivem secando e voltando a encher pra mim
lindos textos.
Talvez ele teria enlouquecido antes de tivesse pensado que um dia elas acabariam.
;)
Adoro essas histórias de pessoas que fugiram da sanidade assumindo a insanidade. Na verdade, essa loucura toda sempre fez parte da vida dele, só que inconscientemente. Hoje ele assumiu! Belo conto.
Beijos, Dri!
(Depois de muito tempo...)
Ter coisas para contar e não ter como....não ter inspiração.
Isso pode levar à loucura.
invente.
a imaginação é impossível morrer antes do criador.
Sempre fui boa ouvinte, mas nunca uma contadoras de histórias (mal do cronista)
Hoje em dia substituo o termo "conto-de-fada" por "romance de época".
O poeta nunca morre. ADormece. Adoece. Mas um dia passa. As letras nunca deixam de existir e as histórias podem ser reinventadas.
Beijo!
Ter coisas para contar e não ter como....não ter inspiração.
Isso pode levar à loucura.
[2]
adorei teu blog :*
eu ainda tive oportuniade de ouvir historias dos mais velhos... hj me lembro de algumas, mas não repasso, uma pena!" beijos
Trágico e delicioso!
Sempre comovente!
Amei!
..e não existe nada melhor do que sonhar suas próprias histórias, seus próprios contos.
Beijos
Quem sabe nessa última tentativa, de gritos desesperados, ele ainda tenta encontrar a paixão, passá-la pelo buraco do muro.
Adorei as imagens mentais do texto!
Vc, como sempre, bah...
Beijos, coisalindaddemeuviver.
Sabe, costuma-se dizer que essas mentes assim tão criativas ou inteligentes, mais cedo ou mais tarde acabam se perdendo em si. Sei lá, viu. Beijos
Eu demoro pra responder as pessoas do blog, e sinceramente isso quando respondo, porque lá é mais um refugio dificilmente vejo quem comenta... mais o teu recado chamou minha atenção! rs
brigada pelas suas palavras, e olha, se o amor de voces é verdadeiro e sincero, que eu acredito que seje, é só voces jamais duvidarem porque da certo, tudo da certo quando a gente quer! eu tbm morava em santos e hoje moro em sampa com minha menina, entao boa sorte e principalmente força! :)
Posso ler vezes sem conta sem nunca cansar.
Nunca pude escutar histórias de pessoas mais velhas.. por isso nem tenho muito o que contar.. a coisa boa é que tnho o blog pra poder ler tais histórias.
ehehe
minha sorte
beijo
gosto do teu blog, é bom voltar aqui.
Maurizio
conta quem é? conta conta? como é longe daqui... queríamos saber;
temos (evidentemente) um fraco por escritores marginalizados
aim...
passa o domingo e eu aqui a te esperar...
Postar um comentário